terça-feira, 31 de maio de 2011

o fenômeno de ocidentalização

(o texto a seguir eu fiz para a aula de redação da minha escola. tirei 9,5 e tive meu momento de glória, pois considero minha professora um tanto quanto exigente. aqui vai.)

Globalização, geopoliticamente falando, significa livre fluxo de informações, capitais e pessoas entre os países. Com a revolução tecnológica da internet (que agiliza o fluxo de informações), abertura de países isolados economicamente e expansão do neoliberalismo alguns Estados tornaram-se dependentes do capitalismo e dos valores agregados a ele - tanto econômica quanto culturalmente. Certos padrões ocidentais tornaram-se a representação de "poder", e o motivo por trás disso pode ser compreendido através de uma análise histórica e ideológica.

Historicamente, o ocidente, representado por europeus e norte-americanos, está ligado a explorações, conquistas, avanços tecnológicos e revoluções. A Europa simboliza o avanço social, e os EUA, o econômico. Com toda a sua história e passado tendo construído a base de seu atual sucesso (em termos), não é de se espantar que o ocidente esteja ligado à ideia de poder.

Consequentemente, se o ocidente e sua política neoliberalista são a visão de progresso, sucesso e poder; o oriente (e qualquer outra cultura que vá de encontro aos "valores" capitalistas) e sua cultura seriam a visão do atraso e do fracasso. Com o fortalecimento da globalização, que tende a unificar e igualar culturamente o mundo, o fenômeno contrário, de regionalização, enfraquece - e, com ele, os governos e culturas demasiadamente regionais. A população tende a negar sua cultura para não se sentir "atrasada".

Outras consequências da globalização e da relação dominador/dominado são a exclusão ou anulação de culturas e a padronização - da beleza, dos produtos, da língua, dos valores, das roupas -, a qual está ligada à divulgação de um modo de vida ocidental. A padronização ocorre através de internet, filmes, revistas, até livros, que divulgam valores capitalistas, levando os cidadãos a pensar que seu modo de vida não é adequado por não ser igual ao "American way of life". Assim, para superar o sentimento de exclusão e marginalidade, uma japonesa morena e conservadora assume a aparência de uma francesa consumista.

Vistos todos esses âmbitos (histórico, ideológico e psicológico), compreende-se melhor a dominação ocidental sobre outras culturas. Conclui-se que o ocidente está, por inúmeros motivos e em inúmeras áreas, ligado à ideia de "poder", e por isso os indivíduos tendem a ocidentalizar-se, por exemplo na aparência, reflexo óbvio e visível (e risível). Até que ponto essa ocidentalização continuará é difícil dizer, mas pode-se afirmar que, no futuro, o globo será composto por três hemisférios: setentrional, meridional e ocidental.

segunda-feira, 30 de maio de 2011

a ponte e fim

Eduardo pôs as mãos na cabeça. Precisou respirar fundo algumas vezes, sentia-se um pouco tonto. Um pouco depois, foi despertado pelos passos do garçom, aproximando-se de sua mesa.
- Qual a forma de pagamento, senhor?
- Vamos dividir. À vista.
O garçom pareceu confuso. Seus olhos subitamente adquiriram uma expressão oblíqua, depois de riso, e ele perguntou:
- Seu acompanhante retirou-se e já volta, ou...?
- Não, meu jovem, vou dividir a conta com... - e ao fazer o movimento com a mão indicando os bancos vazios ao seu redor, se deu conta de que estava sozinho. Piscou os olhos lentamente e procurou indícios da presença de Dibs, Fitz, Hermann ou da moça. Quando não foram encontrados, Eduardo sinalizou para o garçom trazer a conta e ponto final.
Pagou a conta e saiu do bar, perturbado. Havia dormido? Bebido demais? Estava sonhando? A última coisa de que se lembrava nitidamente antes de chegar ao bar era de entrar em uma igreja. Será que havia caído no sono dentro da igreja mesmo?
Eduardo andava enquanto pensava tudo isso, e quando o turbilhão de dúvidas em sua mente cessou, começou a prestar atenção no caminho. Parecia que não saía do lugar. Parecia que estava andando pela ponte sobre o lado prateado há vários minutos - a ponte não era tão grande assim. E ainda encontrava-se no meio do caminho! Curioso! Eduardo começou a correr, mas quanto mais ele corria, mais a outra margem afastava-se, mas ao olhar para trás, não tinha saído do lugar. Sentou-se devido à exaustão.
Foi então que reparou nas roupas que estava usando. Os sapatos de Dibs, o terno de Hermann e os cabelos e gravata de Fitz. Fora suas mãos, que eram iguais às da Dama.
Algo fez Eduardo levantar o olhar e virar-se para o início da ponte. Lá estava Dibs. Ele parecia não notar a existência de Eduardo. Estava lá, com seu olhar romântico, perdido, indeciso entre apreciar o caminho pelo que veio ou a ponte a que estava se dirigindo. Mesmo assim, parecia estar na iminência de fazer uma decisão, o que exalava força e autoconfiança de seu indeciso sorriso.
Então notou alguém de pé ao seu lado. Era Fitz. Não olhava para nenhum dos lados da ponte, não olhava para o tão bonito lago, não olhava para a lua - olhava para os próprios pés, para as próprias mãos. Parecia tão triste e tão decepcionado. Olhou para o fim do caminho, olhou para o começo, e em sua expressão ficou muito claro que queria estar em qualquer dos dois lugares, menos no que estava - no meio do caminho. Não exalava a autoconfiança de Dibs, na verdade, apesar de tentar disfarçar, parecia estar muito indeciso e infeliz. Eduardo sentiu pena de Fitz.
E então viu Hermann, no final da ponte. Mãos nos bolsos, olhava de cima pra baixo para a ponte, parecia sentir-se superior por ter conseguido chegar ao outro lado inteiro. Mas lançava olhares tristes para o lago, para a lua, para as pedras de que era composta a ponte, como se estivesse arrependido de não ter notado esses detalhes enquanto estivera atravessando-a. Focou-se em atravessar a ponte dignamente e de cabeça erguida que perdeu o lado humano e curioso de aproveitar o caminho. Parecia tão triste quanto Fitz, mas sua postura orgulhosa disfarçava-o bem.
Eduardo não queria chegar ao outro lado da ponte decepcionado, também não queria ficar ali no meio indeciso ou arrependido sobre o que fez ou deixou de fazer. Olhou para Dibs, que parecia tão natural, tão pronto para a vida, e percebeu que não devia tê-lo deixado para trás. Fitz parece ter deixado seu Dibs interior para trás, e as consequências disso são visíveis, risíveis. Ainda havia tempo, havia metade da ponte para ser percorrida, muitas luas e muitas marés passariam e Eduardo poderia voltar a aproveitar dignamente sua passagem. E então, num piscar de olhos, todos os três homens desapareceram, e ele percebeu a aproximação em passos lentos e suaves da Dama, carregando um lampião, que iluminava a ponte inteira. Ela estava sempre por perto, guiando seus pensamentos, guiando-o pela travessia da ponte. Embora não tivesse se feito muito presente no início da travessia, agora lá estava ela.
- Decidiste? A ponte ficou mais clara agora?
Eduardo fez que sim com a cabeça.

No instante seguinte, encontrou-se na poltrona vermelho-sangue, numa sala muito bem iluminada por uma luminária grande que agora estava no centro da sala.

FIM \o/

terça-feira, 24 de maio de 2011

a paz

- Antes de eu encerrar esse encontro - Dama começou - queria perguntar-lhes: como alcançar a paz?
- A paz de espírito? - Eduardo perguntou. - É um conceito bem... complicado. Não ouso dizer que seja inalcançável, mas até hoje temo que eu não tenha encontrado um método que me guie à paz de espírito...
- Depende do seu conceito de paz de espírito. - Hermann começou. - Acredito que nossa vida seja um círculo vicioso: temos um objetivo, batalhamos, alcançamos, nos entediamos e logo encontramos um outro objetivo, e por mais nobre, mais complexo que seja tal objetivo, a tendência é de nos frustrarmos quando alcançamos tal, pois sempre parece que o esforço foi maior que a recompensa. Superestimamos a recompensa, quando o contrário é que devia ser feito, mas, enfim. Acredito que a paz de espírito, olhando desse ponto de vista, seja alcançada quando conseguimos aproveitar mais a viagem do que o destino, o esforço do que a recompensa, o processo do que o grand finale.
- Acredito que a paz de espírito está no coração dos ignorantes. - Fitz disse, pausadamente. - Para aqueles que não saem da "cotidianice", que olham para seus problemas por um prisma egoísta e totalmente não-relativista. Não ter o peso do intelecto e de séculos de reflexões sobre seus ombros é, sem dúvida, a maior paz de espírito que existe.
- Algumas religiões e filosofias orientais acreditam que você pode se libertar de todas as angústias e problemas desapegando-se de tudo o que é material - Dibs disse - e isso inclui não só bens e objetos, mas também envolve que você não se relacione com ninguém, seja esse relacionamento familiar, amoroso ou amigável. O ato de desprender-se, de certa forma, de toda a sua vida implicaria uma paz de espírito constante por não haver com o que se preocupar. Tudo é passageiro.
- Não gosto dessa ideia. Se eu me desprendesse de toda a minha vida, eu me desprenderia também de mim e de minha identidade, minha história. Eu realmente teria paz de espírito, porque não teria de refletir nem de me preocupar com nada, já que tudo é passageiro! - Apontou Eduardo. - Eu, quando jovem, gostava de pensar que eu alcançaria a paz o dia em que estivesse fazendo algo bom para mim e útil para o fator externo, seja esse fator a sociedade ou minha família. Esse equilíbrio, assim como Hermann disse, tendo a acreditar que só pode ser acessível quando começamos a pensar o valor das coisas por que passamos na nossa vida. Isso está incluso no gigante pacote definido por "aproveitar a viagem". Acho que essa determinação do que é válido e do que não é só pode ser feita se olharmos para nossa vida de fora, de cima, como se estivéssemos no topo de uma montanha: o que é pequeno some, apenas grandes formações continuam visíveis, e são essas grandes formações que merecem nossa atenção.
- Mas para alcançar-se essa forma de visão, tão cósmica, primeiro precisa-se reconhecer que, apesar de tudo por que passamos ter certa influência, mesmo que minúscula, na nossa identidade, deve-se aprender a valorizar acontecimentos ou reflexões realmente importantes: formadores de caráter, questionadores de nossa ética... e isso exige um certo desprendimento, sim, da predominância das emoções, as quais geralmente influenciam no nosso juízo de valores do que é realmente importante e o que pode ser considerado fútil - Fitz disse. - Tal atitude só pode ser esperada dos mais ricos intelectualmente. Não sei vocês, mas eu vivo em constante angústia e, apesar de eu também não gostar de utopias, como Dibs, tendo a pender para o lado cético da questão, o lado que grita "estás louco?!, paz de espírito é para parvos, sem grandes questionamentos ou grandes angústias!".
- Vocês acham que tudo na vida é muito fácil. - Dibs disse, de forma disparata. - Tudo é ou inalcançável ou só digno de idiotas. Não é você mesmo que estava falando sobre aproveitar a viagem, Hermann? E não é essa a beleza? Acompanhar a sua evolução como ser humano, (racional, social e de alma muito rica), enquanto busca a paz de espírito, a solução dos problemas e uma forma mais saudável de encarar a vida? Não é isso o que torna a vida cheia de significado e aprendizado? Você acha, Fitz, que a vida de um parvo, em seu final, terá muito significado? Não que eu esteja desvalorizando vidas, cada um a aproveita da forma que bem quiser, só que um ser que se questionou e refletiu durante toda sua existência tornará sua vida muito mais significativa do que alguém que só cumpriu sua função biológica de existência. - Dibs então parou para tomar fôlego. - E não me venham com a ladainha de "mas o destino inexorável de todos é a morte". Isso só deveria fazer com que aproveitássemos mais, tendo a consciência de que, provavelmente, essa será nossa primeira e última chance.
Dibs revelava-se e os outros três homens encolhiam-se em suas roupas, envergonhados por terem deixado morrer dentro de si o Dibs que ali um dia esteve.

segunda-feira, 16 de maio de 2011

sobre personalidades

O homem definitivamente é composto de várias facetas que coexistem - nem sempre em plena harmonia, mas coexistem, uma não anulando a outra. Definir-se como tendo uma, duas ou dez faces é limitar todo o processo eterno de formação e expansão de seus caráter, personalidade e alma. Por mais que alguns dos lados do indivíduo seja evanescente, efêmero; as características que o compõem não o são, e continuarão existindo, pertencentes a outras facetas, dissolvidas na imensidão de nosso universo particular.
Tendemos a achar que nossa personalidade é dividida em vários âmbitos, tipificados, com uma ou outra característica mais marcante, tornando assim mais fácil o processo de reconhecimento de tal faceta. Mas tal faceta não é composta por só uma característica, por só um tipo, por um só sentimento predominante. Há uma história por trás desse sentimento e dessa característica, há motivos por trás da determinação e da formação de tal face, tornando cada uma das faces uma micropersonalidade, uma ramificação da síntese personalítica - mas não menos complexa.

Sendo assim, quanto mais vivências, questionamentos, experiências, leituras, reflexões, situações, atritos, conflitos e decisões passamos ou temos de fazer, uma nova ramificação se forma, partindo da mesma raiz sólida e concreta que são nossos valores, princípios, ideais e sonhos.

Essa infinidade de lados existe por um motivo. Quanto mais rica a personalidade, quanto mais diferentes e variadas forem as formas de olhar para uma mesma questão; mais pertinente, útil e benéfica para todas as micropersonalidades a decisão final será - mas também mais difícil de ser feita e de ser aceita. Uma pessoa que não tem acesso ao conhecimento científico a respeito de tal doença aceitará a morte como sua única possibilidade e seu destino fatídico - é porque deus quis. Já quem tem acesso a todos os livros, bulas, teses e médicos possíveis fará o máximo para que haja outros caminhos, outras alternativas, uma sempre melhor que a outra.
E por mais que haja algum traço que não nos agrade em nossa personalidade - algum traço que não precisava existir e que continua lá, por algum motivo, como um vício -, ele é tão necessário para o processo de autodescobrimento quanto os traços que nos são úteis e que se sobrepõem aos outros. Justamente os de que não gostamos ou que não aceitamos em nós mesmos é que nos afastam das outras pessoas que possuem semelhantes. Quando aprendemos a lidar com o que nos incomoda - quando damos nomes aos nossos fantasmas - é que passamos a viver em harmonia com tal traço em nós presente.

Mas, no final das contas, sejam as ramificações evanescentes ou cicatrizes, o conjunto todo forma o sujeito, que dará frutos, responderá às estações e se desenvolverá de forma única e diferenciada.

terça-feira, 10 de maio de 2011

dibs pronuncia-se

- Sabem o que eu acho? - começou Dibs. - Acho que os tolos aqui são vocês. Vocês é que são o hedonistas e escravos do capitalismo, os manipulados, os infelizes, os insatisfeitos e os ingênuos! Vocês - até você, Hermann - é que se deixam cegar pela ganância, prepotência, ignorância e pseudo-busca por um sentido da vida. Não os culpo! Acho que o tempo tornou-os duros e de certa forma cegos ao que realmente importa. Mas é muita agnosia da parte de vocês acharem, que por serem mais velhos e estudados do que eu, que sabem mais sobre a vida ou que têm o futuro mais apropriadamente traçado. Filósofos, pensadores, psicólogos e sociólogos de muitas gerações já afirmaram que devíamos ver o mundo com o olhar das crianças, não no sentido de um olhar sem malícia, mas de um olhar de quem aproveita o que está vivendo, de quem tem sonhos no coração e procura concretizá-los da forma melhor e mutuamente benéfica possível... quando crianças é que aprendemos a amar, sentir, sonhar e planejar corretamente... esses valores todos vão se dissolvendo dentro de nós com a idade e o falso conceito de maturidade... Portando, do meu ponto de vista, ingênuos são vocês, que se acham bons o suficiente para viverem sozinhos!
Não é preciso dizer, caro leitor, que a atmosfera ficou cheia de tensão e indignação. Hermann sentia-se envergonhado por ter recebido uma lição de moral de tão jovem criatura, Fitz sentia-se indignado e já calculava respostas para cada sentença dita por Dibs, e Eduardo estava realmente refletindo sobre o que Dibs dissera. Mas, de forma geral, o que cada um se perguntava era: e se Dibs estiver realmente certo? E se aqueles valores mencionados por ele tornassem a vida realmente mais proveitosa e menos difícil?
Eduardo começava a sentir vontade de bater sua cabeça contra a parede. Trinta e tantos anos, vinte e tantos investidos em agradar a terceiros. Os últimos dez anos de sua vida empregara apenas em reverter suas habilidades em algo que poderia ser útil apenas aos outros e que não lhe dava nenhum prazer. Alguém que passa tanto tempo assim ou é realmente ignóbil e não dá valor à própria vida ou é alguém que aterroriza-se só com a ideia de fazer algo por si próprio, de seguir os próprios sonhos independentemente de sua utilidade ao capitalismo atual, se arcar com as consequências das próprias escolhas.
Hermann tentava calcular onde é que tinha errado. Tudo aquilo parecia tão óbvio, mas Hermann acostumou-se a olhar através do óbvio, então muitas vezes não capta as coisas mais simples. Tanta complicação, tantas desculpas, tantos motivos para não aproveitar a vida; que Hermann esqueceu-se do valor-mor, instintivo, primitivo e poético em todos os sentidos: simplesmente aproveitá-la, pois não teria outra. Tornar-se escravo das próprias ideologias, epifanias, medos, hipóteses e obrigações para com a tal sociedade também é uma forma de anular-se. Prender-se à tarefa sem aproveitá-la é tão herege quanto não fazê-la.
Fitz não queria aceitar que sim, talvez Dibs esteja certo, talvez afastar as pessoas não seja a atitude mais certa a se tomar. Julgar o caráter das pessoas baseado em seu nível intelectual é tão errado. Prova disso era ele mesmo - extremamente dotado intelectualmente, mas não serviria como referência de cidadão moral. Tampouco seria um amigo de verdade. Tendo sua existência marcada por solidão e muitas contradições dentro de si, Fitz concluiu que sim, há um método alternativo, a felicidade é possível, arrogância não é sinônimo de superioridade.
Dibs era, sem dúvida, o jovem que um dia os outros três foram, mas abandonaram por conveniência ou falta de utilidade, e aquela conversa resgatara valores há muito esquecidos...