sexta-feira, 8 de fevereiro de 2013

liberdade, liberdade

Às vezes eu reflito sobre quais de minhas ações são realizadas em plena liberdade.

Antes de mais nada, já mudei minha noção de liberdade milhares de vezes. A primeira ideia que tive era que liberdade é quando você tem a possibilidade de fazer escolhas - mas é fácil pensar em situações nas quais você tem escolhas, mas não tem plena liberdade. Por exemplo, quando você vai a uma sorveteria e só encontra dois sabores de sorvete. Você escolhe entre os dois, mas, como só há dois sabores, você não foi totalmente livre em sua escolha - sua escolha foi ditada pela contingência, por uma coisa pré-estabelecida; sua ação não foi totalmente autônoma. Logo, nunca uma escolha entre várias opções é totalmente livre.
Alguém poderia dizer que é melhor ter opção do que não ter - e que, mesmo a escolha sendo restrita, ainda assim se tem a liberdade de fazê-la. Sim, pior ainda seria se fôssemos escravos da contingência - e muitos o são. Acredito que os indivíduos que constituem as classes mais baixas da sociedade, assim como grupos estigmatizados (negros, homossexuais, e, infelizmente, mulheres), muito dificilmente agirão de forma autônoma. Quaisquer de suas ações serão feitas baseadas em escolher o que se pode escolher, e não necessariamente o que se quer fazer. E o que é pior: movimentos que tentem igualar a liberdade das pessoas, tentando, assim, anular fatos arbitrários, exteriores ao indivíduo, são vistos com maus olhos - ações afirmativas e os movimentos negro, LGTB e feminista.
"Mas, afinal", você se pergunta, "o que é ser livre pra você, Bruna?". Digo que concordo com Kant: somos livres quando agimos com autonomia - ou seja, quando agimos de acordo com um princípio criado por nós mesmo, que tem uma finalidade em si mesmo (ou seja, quando fazemos algo para atingir tal resultado, essa ação não é autônoma). Ou seja, ser bom por ser bom. Ser justo por ser justo. Escolher por escolher. É claro que damos significado para todas as nossas açõs - caso contrário, viveríamos num vazio de sentido. Mas o que eu quero dizer é que o princípio que rege todas essas ações é algo que foi criado por você mesmo, e, mesmo que você faça algo pressupondo uma finalidade, essa finalidade será apenas consequência de seu próprio ato, já que ele termina em si mesmo. Quando você é justo por ser justo, você o faz por acreditar que essa é a forma ética de agir, esperando, com isso, corrigir alguma injustiça ou dar um exemplo.

Porém, quando percebi que, sim, de fato, concordo com isso, fiquei angustiada. Muito angustiada. Porque parei pra pensar se alguma vez na minha vida eu já fui livre. E voltamos ao começo do texto.

Claro que, prontamente, já excluí todas as minhas ações baseadas numa escolha com opções restritas. Mas depois pensei melhor. E quando, dentre as opções apresentadas, há algo que eu realmente queria? Algo que eu continuaria querendo se não estivesse dentre minhas opções? Algo que eu faria como finalidade em si? Como, por exemplo, escolher um livro dentre os disponíveis na livraria. Escolher ouvir uma música dentre as disponíveis no youtube. Escolher assistir a um programa dentre os que estão passando na televisão. Sob essa perspectiva, as coisas melhoraram!, e não mais me senti tão escrava da contingência.
É claro que alguém poderia argumentar que os motivos que me fizeram fazer determinadas escolhas autônomas são fruto da contingência (que eu escolho o livro x e não o y porque a maioria das mulheres assim o fazem, ou porque é o livro valorizado pela minha classe social, ou porque meu pai gosta do livro e eu tenho complexo de édipo, interprete de acordo com sua corrente filosófica), mas eu prefiro acreditar que não, porque eu, aos meus 17-quase-18 anos já tive tempo suficiente para decidir meus próprios gostos sem interferência direta ou predominante de grupo ou instituição nenhuma.
Também excluí ações básicas do dia-a-dia, de rotina, porque, bem, não sei vocês, mas tudo o que eu faço no dia-a-dia faço ou por obrigação ou com alguma finalidade. Sobra o final de semana. No final de semana (para aqueles que o tem livre), no feriado, nas férias temos nosso momento de liberdade. E isso nos angustia. Liberdade dá angústia!, afinal, o que é o tédio dominical senão angústia devido a ociosidade? Sim, pois liberdade dá medo - quando fazemos tudo automaticamente, é fácil, é indolor, agora quando temos de fazer decisões por nós mesmos, a situação se complica, e sentimos angústia (segundo Kierkegaard, angústia é a vertigem da liberdade). Mas enfim.

O que eu realmente quero dizer é que eu me encontro livre nas coisas pequenas que faço. Ler o final de um livro, e não o começo, só pela graça do ato. Segurar as mãos do meu namorado só pelo prazer de segurar. Sentar do lado de fora de casa e olhar pro céu só por sua beleza. Sentar ao meu piano e tocá-lo só pela felicidade que isso me proporciona. Sentar à frente do computador e escrever... e escrever, e escrever.

Autonomia é um negócio complicado.

domingo, 3 de fevereiro de 2013

medos e expectativas

Como eu sou partidária da ideia de que escrever é organizar o pensamento, este post que escrevo agora é com tal propósito.

Venho tentando definir o que exatamente sinto, agora que o colegial acabou e eu passei na faculdade... na verdade, eu não consigo definir sequer o que senti quando vi "você foi convocada para a 1ª matrícula" na página dos três vestibulares que prestei. É que, entendam, eu não sou a pessoa mais autoconfiante do mundo, na verdade, tendo a desvalorizar muito minhas conquistas, então ter conseguido tudo o que eu queria foi uma experiência muito interessante. Tirei um peso enorme das minhas costas (o medo de não passar e de decepcionar muita, mas MUITA gente). E eu ainda não consegui digerir o fato de que não vou mais precisar decorar fórmulas, nomes de tecidos vegetais, funções de neurotransmissores, saber quais sais precipitam e quais se dissolvem, se um conjunto de equações é possível, impossível ou possível indeterminado, qual o relevo predominante no Brasil, em que ano aconteceu a crise dos mísseis de cuba, qual a origem da relação de suserania e vassalagem, qual o sentido do vetor velocidade em uma chapa eletrizada, qual a direção e o sentido da força resultante... ocupei minha cabeça com tudo isso durante tanto tempo que agora parece estranho eu não precisar mais saber de nada disso. Parece estranha a ideia de que, nos próximos 5 anos, eu vou estudar (com algumas exceções) algo de que gosto. É claro que vou sentir falta de algumas coisas, mas a vida é feita de escolhas.
É claro que também tenho alguns receios. Tenho medo (e uma pequena certeza que tento reprimir) de que não vou ter tempo pra ler coisas por fora dos estudos. Tenho medo de não gostar (e de descobrir que aquilo não é pra mim). Tenho medo de não fazer amigos (porque, bem. empiricamente falando...). Tenho medo de não me adaptar. Tenho medo de não ser bem-sucedida (porque uma coisa é tirar notas altas no colegial... na faculdade é outra história...). Tenho medo de me perder no meio do curso. Tenho TANTO medo de ser rejeitada, de não me enturmar, de ficar num canto da sala até 2017...
Mas também tenho expectativas. Quero entrar num grupo de estudos/pesquisa, quero fazer minha iniciação científica, quero ter a melhor formação possível e vou me esforçar ao máximo pra, desde o primeiro ano, direcionar-me pra área de que gosto (filosofia do direito)... fazer amigos, encontrar minha turma... livrar-me da sombra de algumas pessoas que me acompanham desde o primeiro colegial... livrar-me da imagem que foi formada de mim (imagem que não tive chance de construir nem desfazer) e que não me representa nem um pouco... basicamente, tenho a expectativa de começar do zero. Em tudo.

Parei de escrever por alguns minutos pra olhar as flores que minha mãe comprou pra mim por eu ter passado na USP. E percebi o quanto eu não teria conseguido nada do que eu consegui se não fosse minha família (pai, mãe e irmão) me aturando. Gente, eu surtei muito em 2012. Eu estudei demais, me desgastei muito mais do que precisava - e é claro que eu descontava em quem estava mais perto.
Entre gastrites e ataques de ansiedade, entre muitas cartelas de dorflex e vidrinhos de Rescue, entre frutas e pães com geleia, entre doces da cantina e comida japonesa do mercadão passou-se meu ano do terceiro colegial. (De longe, o colegial com certeza assume o primeiro lugar do meu ranking "piores momentos da minha vida", mas meu terceiro colegial foi bem agradável, até)
Além de minha família, tenho muito a agradecer a meus amigos (dentre os quais destaco minha futura estilista favorita, Paolla Machado, companheiríssima durante o ano inteiro, dividindo comigo experiências, frustrações, expectativas, medos, ansiedades, remédios, reflexões, raivas, surtos, almoços, livros de estudo, lágrimas, o peso na consciência de passar tardes sem fazer nada e, o mais importante, foi uma das pessoas que, apesar do intenso bullying, me fez acreditar em mim mesma e no meu potencial de atingir o que eu quisesse), e, é claro, meus professores (especialmente alguns de exatas, que tiveram paciência infinita pra tirar todas as minhas dúvidas, e os de língua portuguesa, que sempre tiveram papel fundamental em minha formação).
Tenho a agradecer também a alguns lovely strangers que comentam aqui de vez em quando em anônimo e sempre fazem meu dia feliz.

Não quero me gabar, juro, não quero ser pedante, só estou escrevendo aqui para dividir com meus leitores (por eu não poder ver seus rostos, sinto-me estranhamente mais confortável) meus pensamentos e minhas conquistas - e elas são três aprovações em Direito (UFRJ, UNESP e USP/RP). Respondendo a um anônimo, vou cursar USP aqui em Ribeirão, sim.

E eis que começa uma nova fase da minha vida. A partir do dia 18 (dia da matrícula), shit will get real.

Desejem-me sorte. Beijos, que a força esteja com vocês, vivam longa e prosperamente.