Lisa estava indo ao Subway mais próximo, na esquina da Nove com a Portugal, pois era o único restaurante que poderia estar aberto até tão tarde. Como uma boa workaholic, Lisa fizera hora extra para usar de argumento quando for pedir para o chefe a tão almejada promoção.
O lado bom de andar nas calçadas da Nove de Julho à uma da manhã é que as luzes de natal deixam o ambiente úmido e frio mais aconchegante e mágico. O céu estava limpo e as estrelas brilhavam com força, mas se estivesse nevando um pouco o lugar ficaria mais bonito ainda.
Ela andava a passos longos e arritmados, só conseguia andar com um ritmo constante quando estava ouvindo alguma música. Seus passos ecoavam ao longo do quarteirão, e o único movimento por ali, apesar de ser madrugada de sexta para sábado, era o de prostitutas. Ela esfregou as mãos e percebeu que o frio agradava-lhe, e praguejou mentalmente por morar num país tropical.
Estava chegando ao Subway quando viu que a porta estava fechada, e ali encontrava-se uma placa, na qual lia-se o bilhete "Horário especial: dia 24, das 10:00 às 18:00; dia 25 não abriremos". É claro, que tolice. Era uma da manhã do dia vinte e cinco de dezembro. Ingenuidade pensar que algum lugar estaria aberto. Ela sentou-se na calçada, beirando a rua, e bufou. Riu sozinha da besteira que fez.
Foi quando viu alguém do lado oposto da rua, sentado exatamente como ela, na frente de um posto de gasolina fechado. Ela virou a cabeça para o lado, a figura o fez também. Ela piscou com a luz do celular duas vezes, a figura o fez três vezes. Esta então sentou-se embaixo de um dos poucos postes iluminados, possibilitando assim que Lisa tivesse a visão, embora embaçada, do seu rosto. Era um rapaz de camisa, gravata e mochila; provavelmente estava ali porque trabalhara até mais tarde, seus cabelos estavam bagunçados pelo vento frio e cortante e suas mãos cobertas por luvas. Não era de uma beleza excepcional, mas chamava atenção pelos olhos bonitos.
Lisa fez menção de levantar-se e dividir a madrugada de Natal com aquele amável desconhecido, mas desistiu. Ele provavelmente devia estar esperando pela carona de alguém. Então ela refletiu mentalmente por que razão ela estava sozinha. Bom, não tinha namorado, seus pais estavam na Califórnia, sua irmã estava passando o Natal com a família do marido e seu irmão... bem, ela não tinha notícias do irmão havia meses. Não que ela se esforçasse para consegui-las, também. Devia haver alguns meses já que ela não via os pais; qualquer feriado era oportunidade para trabalhar mais e ganhar mais dinheiro. Certo. Ela tinha milhares na poupança, mas não tinha um único indivíduo com quem tomar um vinho espumante, com quem trocar presentes, com quem sorrir e conversar no Natal. Triste? Triste. Deprimente? Deprimente. Satisfatório? Talvez. Lisa era bem conformista e conformada com sua vida. Fazer o quê?, era seu lema.
Absorta em seus pensamentos, não percebeu o amável desconhecido atravessando a rua - sem se preocupar com carros, pois passava um a cada 10 minutos, e era da polícia, fazendo ronda -, sentando-se ao lado dela, abrindo a mochila, pegando uma garrafa de vinho de supermercado e servindo-o num par de copos de plástico.
"Está servida?", ele perguntou, sorrindo.
"Claro", Lisa respondeu. "Um brinde à solidão."
"Não, não gostei..." ele disse, olhando para seus pés e refletindo. "Um brinde ao Natal", disse, por fim.
Ela consentiu com um gesto de cabeça. "Feliz Natal". Os dois brindaram e deram goles longos em seus respectivos copos.
2 comentários:
Esse texto transparece, por entre as palavras, sua faceta romântica e glamourosa, ainda que você tente disfarçá-la com personagens viciados em trabalho, solitários...
Acabou acontecendo um encontro,que é exatamente a essência do natal.
O conto está bem escrito sim, muito bem escrito, mas o achei muito vago. Gosto do final, mas o fato de o estranho "imitar"os gestos da garota podia ser, por exemplo, mais elaborada. Mas, de qualquer jeito, um texto muito bom! =)
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