quinta-feira, 7 de abril de 2011

felicidade

A atmosfera ia ficando cada vez mais carregada de faíscas e tensão entre Eduardo e Hermann. Comentários cínicos e indiretas ficando cada vez mais frequentes. Dibs olhava-os de forma confusa, Fitz tinha seus pés apoiados na mesa e consumia seu segundo charuto. Dama passava os dedos ao redor da sua taça meio cheia (ou meio vazia, dependendo da corrente filosófica do leitor). Tomou fôlego, hesitou, mas levantou a voz.
- Eu queria propor-lhes uma troca de ideias...
- Deus me livre!, para citar Mário Quintana, mademoiselle. Prefiro abster-me da discussão. - Suponho que o leitor já saiba de quem foram essas palavras.
Fitz soltou a fumaça pela boca com um estalo.
- Qual seria o tema?
- Felicidade.
- E se eu não souber o que me faz feliz? - Dibs pronunciou-se.
- Acho que é mais provável que nenhum de nós saiba o que é a felicidade porque a possibilidade de alguém aqui ter sido feliz alguma vez é mínima - Eduardo disse, num tom baixo, calmo, controlado e até vago.
- Não é possível ser feliz -, máxima lançada por Fitz.
Dama encarou-o.
- E por que não?
- Pois a felicidade é algo a que sempre almejamos e sempre almejaremos, e quando superamos um obstáculo para alcançá-la surge sempre outro e outro, por mais que esses obstáculos sejam colocados por nós mesmos. O homem não quer e não merece ser feliz.
- Essa quantidade de obstáculos surge quando não se sabe o que quer - Eduardo disse, encarando Fitz e surpreendendo-se com a similaridade entre os dois. - quando se tem um objetivo em mente, não surgem novos obstáculos, esses só vão ficando cada vez mais complexos, exigindo cada vez mais de nós, e é esse desgaste que nos impede de alcançar o êxtase.
- Eu não sei vocês, mas - Dibs disse, timidamente - eu sou feliz quando estou amando alguém e consequentemente amando-me. Eu... acho que vocês só afastam a felicidade quando pensam muito sobre ela...
Fitz e Eduardo calaram-se. O garoto tinha uma opinião. O garoto tinha uma opinião a respeito de um assunto complexo e labiríntico como felicidade, e expressou-se de forma clara e modesta. Fitz mostrou-se balançado, Eduardo tinha uma expressão nostálgica em seu rosto. Via seu eu adolescente em Dibs.
- A felicidade - Hermann começou a falar, devagar, como se estivesse escolhendo as palavras certas - está na busca pelo que achamos que ela é. A felicidade está no processo, em tudo que conquistamos achando que só no final seremos felizes. Se a busca terminasse, qual seria o motivo para continuarmos vivos? A incessante busca por algo mais nos motiva e deve sempre nos motivar, o problema é que muitos se perdem no caminho e acabam não apreciando a verdadeira beleza da vida, que é o viver, e não o terminar...
No rosto misterioso de expressão quimérica esboçou-se um sorriso. Dama parecia satisfeita.
- Eu não... me considero feliz. Não faço o que eu quero, nunca fiz o que eu queria, e a única certeza que eu tenho é de que eu não gosto de como minha vida está - Eduardo disse.
- Isso é um começo, oras... ao menos você sabe do que você não gosta. - Dibs disse, encarando os próprios sapatos.
- Se o verdadeiro proveito encontra-se na busca pela tal felicidade, então por que eu não sou feliz, Hermann? - Fitz perguntou.
- Talvez você esteja procurando no lugar errado. - Hermann respondeu com um sorriso terapêutico. - Se começasse a viver sua vida por você e não pelos outros talvez você aproveitasse o que eu chamo de processo de descoberta.
- Isso não está certo. Eu tenho meu objetivo em mente. Eu sei o que eu quero. E eu sempre consigo o que eu quero. Na verdade, eu já conquistei meu último objetivo - Fitz disse. - Não é como se eu ligasse também.
- Objetivos superficiais e fáceis. Pela forma como você diz, você deve morrer de medo de desejar algo mais difícil e frustrar-se se não o alcançasse. Fitz, é normal e bom falhar às vezes. Torna-nos humanos.
- Você é um hippie doido! Quer o quê? Que eu me desprenda da sociedade vá viver no campo lendo poesia do século quatorze? Que eu passe a admirar cada segundo do meu dia entediante e sem novidades? Que eu chegue atrasado ao trabalho e quando meu pai pedir uma explicação, eu diga que estava apreciando o milagre da vida ao ver um pássaro sair de um ovo? - Fitz ficou vermelho e fumava cada vez mais compulsivamente. - Poupe-me, Hermann! Eu não quero acabar como você.

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