terça-feira, 1 de março de 2011

a primeira conversa

Achou um tanto estranho aquela quantidade de imposições numa só frase. Claro que não estava acostumado a receber ordens de ninguém - era sempre ele mesmo quem ditava as regras. Talvez por esse motivo mostrou-se tão obediente e ávido por sentir-se subordinado a alguém.
De qualquer forma, levantou-se e foi atrás da mulher. Sua próxima lembrança começa em uma taverna estranhamente vazia. Lá, encontravam-se apenas ele e sua mentora. Ainda não podia ver-lhe as faces, mas tornou a ver seus braços, muito brancos, de pele aveludada. Estavam sentados um de fronte ao outro, e a moça segurava o queixo com as mãos, com os cotovelos apoiados na mesa. Chegava a aparecer que estava admirando-o.
- Do que precisas?, ela finalmente perguntou, após alguns instantes apenas observando-o.
- Como assim, do que eu preciso? Não preciso de nada, já tenho tudo.
- Se hesitas e perguntas é porque não sabes. Responde. Do que precisas?
- Não preciso de nada.
- E por que razão? Não desejas nada?
- Claro que desejo. Desejo sentir algo além de tédio.
- O que comprova minha teoria. Achaste-me pois não aguentavas mais tua rotina.
- Eu te achei fazendo algo que faço todos os dias. Andando na rua à noite, vagando e bebendo.
- E é isto que torna nosso encontro tão interessante.
Eduardo encarou-a. Tinha uma expressão digna de uma esfinge. Parecia que estava desafiando-o a cada palavra. Desafio aceito.
- Quão egoísta és tu?
- Egoísta a ponto de achar que nada pode me salvar além de mim mesmo, e minhas tentativas de absolvição foram totalmente falhas.
- Realmente achas que isto significa ser egoísta?
- Certamente. Alguns buscam a redenção no amor; alguns na religião; outros na realização de sonhos; mas eu, eu transpus todos esses limites.
- Pelo que conheço de ti, sei que nem sempre foste assim. Consegues lembrar-se de como eras antes da vida boêmia?
- Eu era infeliz.
- E o que és agora?
- Apático.

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